A nova forma de trabalhar… no futuro
"Acredito que caminharemos para um híbrido, com algumas sessões presenciais combinadas com cenários de teletrabalho mais abrangentes. Uma lição a reter: nunca descurar a componente humana e social."
Na primeira década de 2000, trabalhava eu num operador nacional de telecomunicações, com a responsabilidade das áreas tecnológicas, nomeadamente a informática, quando surgiu a ameaça de uma potencial pandemia de gripe, o H1N1 ou gripe das aves. A empresa que era até bastante moderna e possuía já algumas ferramentas de trabalho avançadas para a época, teve rapidamente que se adaptar à situação e preparar os postos de trabalho para operarem em regime remoto. Felizmente não passou de um ameaça!
Com base nessa experiência implementámos, desde logo, na ARQUILED a filosofia de posto de trabalho móvel, assente em computador portátil e telemóvel, substituindo todos os computadores e telefones fixos.
O segundo passo foi a mudança para a nuvem, para que, desta forma, toda a informação e aplicações passem a ser acessíveis a partir de qualquer local, através de uma ligação segura.
Por último, e muitíssimo importante, as ferramentas de colaboração. Seja para conversas de texto (vulgo chat), seja para videoconferência ou chamadas de voz. A empresa passou assim a poder operar desmaterializada e, virtualmente, a partir de qualquer lugar do mundo.
Apesar de sermos uma média empresa portuguesa, temos a equipa distribuída por vários locais. Desde Lisboa, Porto, Mora (onde se encontra a fábrica), e alguns colaboradores na Colômbia e no Brasil. Esta abordagem permitiu-nos aproximar as geografias e trabalhar em conjunto de forma rápida e intuitiva. Ao mesmo tempo, implementamos o teletrabalho como opção, seja porque o colaborador precisa de dar assistência familiar, seja porque é necessário estar mais concentrado.
Antecipar o futuro do trabalho para responder à COVID-19
Assim, quando a pandemia de COVID-19 chegou já o processo estava montado. Ainda antes da declaração do estado de emergência, optámos por uma quarentena voluntária, passando todas as funções, que o permitiam incluindo na fábrica, para teletrabalho. A decisão foi comunicada num dia e no dia seguinte estávamos todos em teletrabalho.
Do ponto de vista tecnológico, tudo correu bem. Cada um trabalha ao seu ritmo e há reuniões programadas para sincronismo das equipas. No entanto, sentimos que faltava algo, aquele elo invisível que nos une, de socializarmos, de falarmos de tudo e de nada, extratrabalho. Claramente, faltava a componente social.
Felizmente temos uma equipa fantástica e que logo arranjou uma solução. Passámos a usar uma ferramenta, o Yammer, que é uma rede social fechada apenas dentro da empresa, e que tem como regra única, não falar de trabalho! É como o café que tomamos juntos no escritório e falamos de coisas do quotidiano, trocamos receitas ou participamos em passatempos.
Para além disso, passámos a fazer acompanhamento de proximidade, os gestores reservam algum tempo para ligar aos colaboradores, simplesmente para conversar. Todos estes aspetos tiveram (e têm) um forte impacto na moral e no espírito da equipa. E, apesar de toda a tecnologia, somos seres sociais e essa componente mostrou-se fundamental para garantir a coesão e a produtividade.
Não usamos ferramentas de controlo de presenças e não obrigamos a um horário rígido, mas fazemos questão que os colaboradores percebam que devem criar a separação entre tempo para trabalhar e tempo para lazer. Quando vamos trabalhar para o escritório é o tempo da deslocação que assegura esse desligar. Em casa isso não acontece naturalmente e é necessário criar essa disciplina.
E, apesar das mudanças, a produtividade da empresa tem funcionado normalmente, com muito bons resultados. O trabalho continua a ser feito como se estivéssemos todos no escritório. O negócio internacional inclusive tem acelerado pois, de alguma forma estamos todos nas mesmas circunstâncias, e as videoconferências não têm fronteiras. Não deixa de ser curioso que, ao isolarmo- nos ficámos mais próximos.
Acredito que caminharemos para um híbrido, com algumas sessões presenciais, misturadas com cenários de teletrabalho mais abrangentes.
Uma lição a reter: nunca descurar a componente humana e social.
Miguel Allen Lima
ARQUILED CEO
Master of Science em Engenharia Eletrotécnica e de Computadores pelo IST
Master’s in business administration pelo IESE/AESE
Nota: Este artigo foi publicado originalmente no Público, aqui.